sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A Primeira Dúvida

Luz. Escuro. Luz de novo. Meu olho embaçado ainda não entende o que acontece. Minha cabeça dói como se agulhas penetrassem meu cérebro. Sinto meu corpo responder devagar aos meus estímulos. Minhas pernas pouco se movem. Meus braços estão amarrados. Quando tento falar sinto que não posso. Um pano cobre minha boca. E o ar que passa pelo pano tem gosto doce. Ainda não entendi o que faço aqui. Estou deitada. Meu olho restabelece o foco. Uma sala de paredes densas muito escuras. Meu pescoço não se move. Devo estar imobilizada. Estou tão fixa que só movo os olhos e pouco vejo. Pareço estar sendo movida. Sou colocada de pé. Ereta na maca, ainda amarrada. Aos poucos me dou conta do que se passa. O homem que vi antes ainda está aqui. Mas só vejo um dos homens de branco. O olho dele brilhava. Esfregou as mãos uma na outra. Sorria. Os dentes amarelados, devia fumar. Era magro e tinha cabelos grisalhos. Ostentava um bigode no mesmo tom do cabelo. Um jaleco branco e uma calça que já foi branca. A camisa debaixo era preta. Sentou-se na cadeira que estava a sua frente. Olhou alguns papéis sobre a mesa. Tinham muitos e muitos papéis naquela mesa. Mas tinha uma caneta tinteiro. Em forma de pena. A luz da sala estava fraca. Ele foi até as cortinas e abriu uma parte. Soltando um sorriso vira-se para mim.
"olá menina" "opa! você não pode responder" e riu de novo. "vou tirar ok? não se mova." "como se você pudesse"
Aproximou-se e calmamente tirou o pano. fez uma série de perguntas sem sentido para mim. Devia fazer para ele. Escreveu muitas folhas. Ainda não tinha tirado os olhos da caneta quando ele acabou as perguntas. A ultima confundiu mais. "por que você está aqui Ana?" Por segundos eu não soube o que dizer. "minha mãe me trouxe." Ele continuou com as perguntas sem nexo. Enquanto balançava aquela caneta. Por vezes negociamos por respostas, fui sendo solta. Mesmo com avisos dos homens de branco sentados atras de mim. Em um bom tempo esta presa apenas pelos pés. Ele até é simpático. Diferente daquela mulher. Ele comete o erro e chega perto. Incrivelmente não me movo. Por uma estranha razão confio nele. Ele confia, chegou perto. Apenas verifica minha temperatura. Me da as costas sem medo. Quem ele pensa que é? Ele vai vir de novo. Mais perguntas sobre mim. Quando perdia as esperanças ele chega de novo perto. E com a mão para trás. Tolo. Minha mão dispara em sua direção. As unhas a postos. Minha boca se abria. Mas travei. Ele foi mais rápido. Tanto que quando vi. Não o vi mais. Não vi nada. Escuro. Luz de novo. Continuo imóvel. Ouço ruídos a minha volta. Uma risada. A mesma que ouvi antes. O mesmo esfregar de mãos. Quando abro os olhos vejo o teto. Mas continuo na mesma sala. "é menina, acha que sou bobo?" Eu não conseguia responder. Ele segurava uma seringa na mão. O brilho no olho de quem se divertia. Como se fosse um brinquedo. "sei o estrago que você pode fazer" De fato estava preparado. Ele tirou do bolso outras duas seringas. Cada uma delas deveria ter mais de dez centímetros. "A regra é a seguinte, você pisca para responder"
Pisquei rapidamente. Meus batimentos estavam acelerados. Adrenalina, medo, um amontoado de sensações. Fechei os olhos. Aquele brilho me assustava demais. Sinto uma das agulhas perfurar meu braço esquerdo.
"você é inteligente garota" "não precisa apodrecer aqui dentro"
Mantive meus olhos fechados. Mas sentia seus olhos sobre mim. Divertindo com a agulha que pendia no meu braço. Não abri os olhos. Senti pegar meu braço. Cerrei os olhos com força. As duas agulhas estavam em mim.
"abre os olhos" O medo foi maior. Abri. As duas seringas estavam presas sob a minha pele. Ele sorria. Tinha me dominado sozinho. Nenhum homem de branco estava ali.
"eu ainda não injetei." "tem papel e um lápis no seu bolso." Meus olhos devem ter demonstrado algo. "espantada? eu não"
"Você não vai colaborar não é?" Cerrei meus olhos e não abri mais. Senti seu sorriso de novo.
"nem todo louco está preso a uma agulha, cama ou cadeira. Mas toda palavra tem uma gota de loucura. Aproveite essa." Sorriu. Não abri meus olhos. Mas o que vi sob minhas pálpebras. Foram cores, cores caleidoscópicas. Escuro.

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