domingo, 20 de novembro de 2011

As Primeiras Lembranças

Algo no cheiro de carne ativou minha memória. Me debato enquanto tenho sonhos. Não sei como comecei a dormir. Mas sei que estou dormindo. Agora não tem amarras prendendo meu corpo. O frio abrandou quando coloquei as roupas e encontrei minhas cobertas. O cheiro. Volta e na boca sinto gosto também. Gosto, de uísque? Cenas caóticas passam dentro da minha cabeça. Sinto cheiro da carne. Mas estou de pé. Ouço gritos horrendos. Me ouço gargalhando. Acordo de sobressalto. Meus olhos ardem. Mais o Sono me vence. Caio para trás de novo. Cores muitas cores, talvez a dor tenha causado isso. De novo o cheiro de carte, de novo o gosto de uísque. Mas agora sinto cheiros. Fumaça. Sinto gosto amargo característico também descer a garganta. Fumaça de fumo preparado com essências. Vejo vultos agora. Estão a minha volta e gritam. Tenho um copo nas mãos. Em um segundo tudo ganha forma. Uma sala grande. Pouco iluminada pela luz. Com muitos focos de fumaça. Os vultos ganham formas e traços conhecidos. Me reconheço. Meus braços desenhados e coloridos. Estou fazendo força. Ainda não sei porque. Temos todos praticamente a mesma idade. Isso não faz tanto tempo. Devo estar com dezesseis. As paredes desenhadas da casa me deixam confortável. A mesa de centro tomada de cinzeiros. Esses cheios de bitucas. Tem algo pegajoso no chão. Estou descalça. No sofá outra mulher. Essa abraçada a um dos homens que ri. Enquanto eu gargalho e dou outro gole no copo de liquido azul. Vejo braços levantando pelo ar. Sinto cheiro de sangue forte. Sobressalto e acordo de novo. Fui pega de novo. Mais choques? Não entendo. Olho envolta e o silêncio só é quebrado por aquele som animalesco do lado de fora. Estou tremendo. Encosto a cabeça novamente no travesseiro e apago. O que estão dando pra mim? Volto para o mesmo lugar do sonho. Não estou sonhando. Estou lembrando e isso me assusta muito.Pareço outra antes. Largo o que estou a fazer quando alguém faz força. Solto. Pareço ter deixado alguns quilos saírem do meu colo. Pego um papel na bancada da cozinha mal iluminada. Não tem carne alguma cozinhando. Abro a geladeira e pego uma das seringas ali dentro. Prendo a respiração e choco a agulha com a veia do meu pescoço. Ah o caleidoscópio de cores aparece. Pego uma caneta no bolso de trás de alguém. Que ri e não se importa. Vou até uma área aberta, uma sacada. Escrevo uma enorme poesia falando de mim. Me viro. Para ver a cena que se desenhava do lado de dentro. Minha alma congela. Vejo que a força que fazia ela sobre as costas de alguém. E o cheiro da carne sendo preparada era dele. Do lado do corpo desacordado um ferro de passar roupa fora da tomada. O nariz do garoto está sangrando. Do seu lado quatro seringas sujas de sangue. Eu escrevo mais naquele pedaço de papel. Enquanto na sala um ou dois garotos levantavam o que teve a pele queimada. Está desacordado. Me viro para as estrelas. Elas plantam bananeira e são de varias cores. Isso quando não mudam de cor. A fumaça sai da minha boca. É verdade, eu fumo. Ainda tenho o copo do meu lado. Ataco o papel de novo. escrevo como doida. Meus cabelos já foram azuis. Vejo aquele que teve a pele queimada acordar. E ele grita de dor. Um grito que me faz cócegas. Esse grito deixaria qualquer um congelado, não eu. A minha mão cansa de escrever. A caneta era Dele. Uma caneta tinteiro, prateada. Me sentia tão adulta ali. Levantei e calmamente entrei na sala. Aquele que teve a pele queimada estava parado. Imóvel no chão. Passo por ele e cutuco ele com o pé. Ele responde com murmúrios e vira de lado. Inconsciente. Eu dou mais um chute e ele acorda. Me vê e grita mais. Ele chega e me segura. Me deita no quarto. Não quero dormir. Escuro. Ele deve ter apagado a luz. Quando me levanto e acendo a luz. Não há mais ninguém ali. Eu, as escritas na parede e o chão gosmento de sangue. Meu, do cara que queimei. E de mais um babaca que teve uma overdose no chão do corredor. Ele está sentado no sofá e me da um sorriso largo. Sento ao seu lado. "Sinistra você" e sorri. Com olhar apaixonado. Eu o beijo. E tudo volta a ser vulto. Antes tenho tempo de ver o ferro de passar no chão. Tem algo grudado nele. Como carne de porco quando gruda na panela. Ele vira vulto. E tudo começa a escurecer. Ouço o choro da minha mãe. E acordo. Olho as paredes. Procuro desenhos. Procuro Ele. Procuro a minha mãe. Silêncio. Ouço gritos. Apavorantes que ecoam por todos os corredores daqui. Eu não tremo. Olho para a porta. O homem da caneta esta a me observar."Tens papel e caneta, sabes como usa-los." Sorriu doce. "aproveite" Isso saiu em um tom sinistro. Aproximou de mim. Eu só senti meu braço adormecer. Não reagi. Só ouvi o seu sorriso antes que o escuro voltasse.

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